Uma tendência entre os familly offices (as estruturas de gestão financeira de famílias com grandes patrimônios) é aumentar os investimentos em crédito privado, que são os títulos de dívida emitidos pelas empresas privadas. Um estudo da Aeon Investimentos descobriu que 80% dos gestores desses escritórios pretendem engordar a alocação em crédito privado nos próximos dois anos e, destes, 9% preveem um aumento significativo do volume investido nesses ativos.
Os escritórios de gestão de riquezas familiares ouvidos pela Aeon têm mais de US$ 98,4 bilhões sob gestão atualmente, daí o impacto dessa migração no mercado de renda fixa. E 70% dos gestores apontam dois motivos para embasar a mudança de estratégia: o aumento de transparência nesses ativos alternativos, com as empresas acompanhando a evolução das regras de governança no mercado de capitais; e as taxas de retornos mais atrativas – afinal, o prêmio de risco para o título de crédito privado é maior que o de títulos públicos ou bancários.
As classes que devem atrair mais investimentos até o segundo semestre de 2024 serão os títulos de crédito privado do setor imobiliário residencial, apontado por 52% dos gestores, e de segmentos das finanças corporativas, como aviação comercial, expedição e contas a receber, que apareceram como opção para 51% dos assessores de investimentos dessas estruturas.
Faz parte das estratégias de pouco mais de um quarto dos gestores (26%) aumentar os investimentos no crédito ao consumidor, como em financiamento estudantil ou automotivo, e nos títulos de dívida do setor imobiliário comercial (22%).
A pesquisa aponta que os family offices são mais propensos a alocar em crédito privado por meio de estruturas privadas, os veículos com limitações e critérios para entrada de investidores. Ainda que 60% dos gestores de patrimônios familiares prefiram a primeira opção, 55% também estão abertos a investir via cotas de veículos públicos.
O estudo da Aeon Investimentos levantou dados com 100 assessores de investimentos de family offices do Reino Unido, Estados Unidos, Suíça, Alemanha, Itália e de regiões nórdicas durante o mês de novembro.
Family offices no Brasil voltam à renda fixa em 2022
A gestão de patrimônio, segmento do qual os family offices fazem parte, encerrou o primeiro semestre deste ano com R$ 328,1 bilhões no Brasil. Ainda que não se tenha ao certo qual é a fatia desse mercado nas mãos dos escritórios de gestão de riqueza familiar, certamente está nas cifras dos bilhões.
Geralmente bem investidos na renda fixa – como todo investidor no mercado brasileiro – os family offices reduziram o interesse nesse mercado durante a pandemia, quando a taxa básica de juros da economia (Selic) ficou em 2% ao ano. O número pouco atraente para a renda fixa empurrou os investidores para ativos de risco, e não havia motivos para ser diferente com as famílias abastadas.
O “Family Office Report Brasil” de 2020 (o mais recente divulgado) mostrou que 84% dos escritórios de gestão de riquezas de famílias reduziu as alocações em renda fixa naquele ano. A maioria (83%) dos gestores aumentou os investimentos em ações negociadas na bolsa brasileira. Uma boa parte (50%) também migrou parte desse capital para os fundos multimercados e de ações e para o private equity, que são os investimentos fechados em empresas que não têm capital aberto.
Outra parcela considerável (39%) foi a dos family offices que aumentaram os investimentos em venture capital, os investimentos de risco voltados à aquisição de participação minoritária em empresas com potencial de crescimento elevado, como as startups.
A virada de cenário, com a Selic escalando para 13,75% ao ano no intervalo de dois anos e a maior volatilidade no mercado de capitais, indica que o mercado já deu uma guinada para seguir novamente no sentido contrário. A renda fixa e ativos híbridos voltaram a ter uma representação significativa nas carteiras dos investidores do segmento de gestão patrimonial, saindo de 39,8% e 27,8% no fim de 2021 para 41% e 29,3% em junho deste ano;
No Brasil, o crédito privado premia com juros de 15% ao ano – de maneira geral, esses ativos rendem no mercado o CDI (Certificado de Depósito Interbancário) mais 2% ao ano – sinal de que a estratégia adotada fora também pode ser uma boa saída por aqui. Afinal, ao que tudo indica, o ativo seria como uma boa alternativa para garantir os rendimentos da carteira sem assumir tantos riscos em tempos tortuosos.
Texto originalmente publicado no Valor Investe
Outro indício da virada são os números de setembro da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), que mostram que a oferta e a procura pelo títulos de dívida privada cresceram na comparação anual. A alta foi de 3,81% no agregado de emissões dos títulos de dívida privada no ano, alcançando R$ 40,7 bilhões no mês.