Em um intervalo de poucos dias, os principais players do mercado de investimentos anunciaram números grandiosos ligados à contratação de profissionais em 2022. Foram 5 mil vagas para novos assessores abertas pela XP, 1,3 mil pela EQI, que é associada ao BTG, 1,2 mil pelo Santander, o SafraInvest revelou a intenção de “dobrar o número de colaboradores” e o Itaú pretende encerrar o ano com 129 escritórios e 2,5 mil assessores no total. Para especialistas consultados pela CRC!News, o movimento mostra que o mercado está aquecido e que os bancos tradicionais estão reagindo com força na competição com as assessorias, mas também levanta questões sobre como serão preenchidas as vagas e de que maneira se dará a formação desses profissionais.
Para Diego Ramiro, presidente da ABAAI (Associação Brasileira do Agente Autônomos de Investimento), o movimento é reflexo da ampliação do mercado de assessorias, e mostra que os bancos tradicionais estão atentos e reagindo. “Vejo como um resultado do sucesso das próprias empresas do setor, que conseguiram trazer muito dinheiro para os escritórios e ligaram o alerta dos bancos. E ainda existe muito espaço para crescer se você comparar o universo de 17 mil agentes contra os 100 mil gerentes de instituições bancárias no país”, opina em entrevista à CRC!News.
No caso da XP, que nas últimas semanas revelou a intenção de abrir 5 mil oportunidades até o final do ano, a iniciativa une a força de capacitação da empresa com o apetite dos escritórios por contratação. “Nossos parceiros estão com uma forte demanda por profissionais para atender ao número crescente de leads. E muitos deles ampliaram seus espaços físicos e investiram em uma estrutura interna de formação. Então uma coisa caminha com a outra. Juntou nossa força em capacitação com o apetite deles em contratar”, afirma Bruno Solano, sócio e responsável pela Expansão B2B na XP.
Gabriela Assis, Head de Growth e Onboard da XP, afirma que cerca de 75% das vagas serão voltadas diretamente para assessoria, enquanto os outros 25% irão para áreas de apoio. “Antes o assessor fazia de tudo, mas agora precisamos de pessoas específicas para outras cadeiras, como BI, marketing, além de gente especializada em determinados produtos, como renda variável, previdência, seguros, crédito. Isso abre as portas não apenas para quem saiu do banco, mas para pessoas de outras áreas que possuem skill de vendas e querem fazer a transição de carreira, como advogados e engenheiros”, explica.
O movimento é acompanhado de perto pelo BTG, que não revelou um número total de contratações para o ano, mas viu a EQI, seu principal escritório associado, anunciar recentemente 1,3 mil vagas a serem preenchidas ainda em 2022, incluindo oportunidades para quem já é da área ou busca migrar de carreira.
Filipe Medeiros, CEO e fundador da consultoria AAWZ, aponta que, desde o ano passado, ocorreram muitos aportes das corretoras via contratos de exclusividade. Com isso, os escritórios ganharam caixa e se transformaram em algo mais estruturado e corporativo, o que vem permitindo todos esses investimentos. “Estamos falando de um mercado com algo em torno de R$600 bilhões sob custódia, e que em 2030 deve chegar a R$2 trilhões. Ou seja, o segmento B2B ficou grande demais para os bancos ignorarem”, revela.
Bancos reagem
A iniciativa do Santander de contratar 1,2 mil novos assessores sob o regime CLT, também anunciada nas últimas semanas, vai de encontro à avaliação de Medeiros. Os novos profissionais vão receber uma carteira de 100 clientes da própria instituição, sendo remunerados apenas pela sua manutenção, além de receber bônus na negociação de novos produtos e na incorporação de novos investidores.
O SafraInvest, por sua vez, ainda que não tenha entrado em números, revelou que está “dobrando o número de colaboradoras”, além de lançar um novo aplicativo para aprimorar o atendimento dos seus assessores e reforçar “a parte educacional, de capacitação, com uma grade exclusiva de cursos com foco na qualidade, no atendimento e no operacional”.
Por fim, o Itaú anunciou no início do mês que, desde março de 2021, já inaugurou 110 escritórios de investimento em todo o território nacional sob o modelo íon, totalizando 1,7 profissionais, 460 mil clientes e mais de R$400 bilhões em patrimônio líquido sob gestão. Até o final do ano, serão mais 19 escritórios, com novas unidades previstas para Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP) e Petrópolis (RJ), elevando o total de especialistas da rede a 2,5 mil pessoas.
Medeiros explica que o boom de XP e BTG ocorreu porque as corretoras e assessorias foram felizes em tirar os profissionais dos bancos com uma proposta de torná-los empreendedores. Porém, ainda que muitos tenham ficado seduzidos com essa ideia de independência, na prática nem todos se adequaram à nova realidade e sentem falta do modelo CLT, que traz maior segurança por meio de um salário fixo, mas sem permitir que a pessoa não participe da sociedade e da tomada de decisão.
“Os modelos de agente autônomo e CLT devem coexistir, pois não existe um melhor. São propostas diferentes voltadas a perfis diferentes de profissionais e suas expectativas. Vejo esse movimento dos bancos como uma primeira ação voltada para estancar a sangria. Mas acredito que não vá parar por aí. Assim como as corretoras estão se posicionando no B2C, os bancos devem se posicionar de forma mais forte no B2B também”, opina
Desafio em formação
Na visão de Ramiro, um dos grandes desafios para a onda de contratações prevista para 2022 será a capacitação desses profissionais. “Estamos falando de adicionar algo em torno de 9 mil pessoas, o que representa 70% de uma indústria que levou anos para ser formada. Não será do dia para a noite”, opina.
Ele destaca que o primeiro passo será a obtenção do certificado para exercer a atividade. Como se trata de uma prova com alta taxa de reprovação, muitas plataformas já estão bancando cursos preparatórios para seus candidatos. “Nesse sentido, a ABAAI está em diálogo com a Ancord para mudar o formato da prova para algo que seja mais condizente com a realidade de trabalho. A profissão evoluiu, e o exame precisa estar mais alinhado com o dia a dia do assessor”, afirma.
Além da preparação para a prova, os novos profissionais também vão demandar capacitações para o exercício de suas funções. “Não existe mão de obra pronta para isso. Vai ter que ser formado, e já vemos um movimento nesse sentido tanto das corretoras, quanto dos próprios escritórios”, diz Medeiros.
A XP aposta na estrutura de sua universidade para dar conta de preparar o grande número de profissionais que devem ingressar na empresa ainda em 2022. “O principal pilar da XP sempre foi a educação financeira. Nossa capacitação começa logo na entrada, a partir do momento que a pessoas demonstra interesse na área. Oferecemos apoio para tirar a certificação. Depois, temos nossas incubadoras, treinamentos presenciais e reciclagens periódicas. Além disso, contamos com escritórios mais robustos com um hub interno de tecnologia e que complementam o processo com suas próprias formações”, completa Gabriela.
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