A revelação de um rombo de R$20 bilhões no balanço da Americanas pegou o mercado de surpresa na última semana. Considerada uma das principais redes de varejo do país, os papéis da empresa registraram a queda diária mais acentuada da bolsa brasileira desde 1994, com perdas que superaram 77%. Em conversa com a CRC!News, João Peixoto Neto, CEO da Ouro Preto Investimentos, fala sobre as perspectivas para o papel e detalha quais lições pode-se tirar do caso. Confira.
O que fazer com os papéis da Americanas diante das atuais circunstâncias? Deve-se vender o quanto antes ou a volatilidade dos últimos dias abre algum tipo de oportunidade?
Em relação às ações, considerando que já houve uma queda de 85% nos preços, não acho que faça sentido se desfazer delas neste momento. A não ser que haja realmente necessidade ou por alguma outra exigência. Mas ainda há o risco das ações virarem pó, ou seja, perderem completamente o seu valor? Sem dúvida que há, pois a empresa pode falir. Mas a desvalorização das ações já foi tão acentuada que é melhor aguardar mais um pouco para ver se os controladores e credores encontrarão uma saída para a empresa. Todos os bancos e fundos credores têm interesse na salvação da empresa. Acredito que a melhor decisão seria não se desfazer agora das ações e aguardar mais um tempo na esperança de que a empresa possa vir a ser resgatada pelos controladores ou por acordo de credores em uma operação de recuperação extra ou judicial.
Em relação aos títulos de dívidas, como debêntures e outros papéis, eles já estão sendo negociados pela metade do preço. Minha opção seria vendê-los no mercado secundário com esse deságio de até 50%, caso haja compradores. A não ser que a pessoa tenha papéis que contem com garantias reais ou que tenham que ser pagos no curto espaço de tempo para que a empresa possa continuar suas operações.
O valor da dívida das Americanas é impagável e a empresa só conseguirá se recuperar se houver um grande abatimento e alongamento de suas dívidas. Que os credores perderão dinheiro, isso é evidente. Portanto, se você vender tais papéis com um forte deságio, você estará antecipando algo que inevitavelmente irá ocorrer. Não vendê-los é correr o risco de perder tudo com uma eventual falência da empresa.
O caso tem potencial para afetar outras empresas do setor de varejo?
Há, sim, um grande potencial de contaminação. O caso gerou uma desconfiança em relação às outras grandes e tradicionais empresas brasileiras do varejo, que estão sofrendo neste momento por conta de diversos fatores, como a redução de suas margens de lucros; redução nas vendas em decorrência da perda de poder aquisitivo da população por conta da alta inflacionária; elevação de suas dívidas e do custo de novas operações financeiras em virtude do aumento da taxa de juros; o peso da concorrência de marketplaces estrangeiros, como Shopee e Ali Baba, que praticam preços mais baixos, ou que souberam criar sites mais amigáveis, operações logísticas mais eficientes e um melhor atendimento aos clientes, como o Mercado Livre e a Amazon.
Quais sinais seriam importantes neste momento para o mercado voltar a confiar no papel?
O mercado só voltaria a confiar no papel, no curto prazo, se houvesse um resgate das Americanas por parte dos seus principais controladores. Ou seja, se o bilionários brasileiros Lemann, Sicupira e Telles injetassem os R$10 bilhões de reais que a maior parte dos credores entende ser o valor mínimo necessário para transmitir ao mercado a segurança de que a empresa conseguirá pagar as suas dívidas e, portanto, não irá à falência.
Quais lições as pessoas podem tirar deste caso para orientar melhor seus investimentos?
Ao que tudo indica, houve uma fraude contábil. E, em se tratando de fraudes, é impossível prevê-las. É claro que existem situações em que as fraudes são tão óbvias que é fácil descobri-las. Porém, neste caso das Americanas, era mesmo impossível prever tal fato. Uma empresa tão tradicional, com ações negociadas em bolsa, com quase um século de existência, com um passado de grandes êxitos e sob o controle das três pessoas mais ricas deste país, que, além disso, são empresários de grande sucesso e conhecidos por serem super dinâmicos, quem poderia imaginar essa situação que se descortinou com a divulgação do fato relevante pelo novo e já velho CEO das Americanas?
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