Após movimentar mais de R$ 215 bilhões no país apenas no ano de 2021, os criptoativos consolidam seu crescimento e se tornam uma opção cada vez mais comum na carteira do investidor brasileiro. Contudo, enquanto em alguns países essa modalidade já se tornou moeda oficial e em outros, como nos Estados Unidos, grupos importantes como o Goldman Sachs começam a oferecer empréstimos lastreados nesse tipo de ativo, o Brasil ainda sofre com a falta de regulamentação do setor. Mas, felizmente, essa questão pode estar perto de ser solucionada.
Aprovado pelo Senado no final de abril, o projeto de lei 4401/2021, busca estabelecer um marco legal para o tema no Brasil. Entre os pontos incluídos no texto está a tipificação de crimes de fraude ligados a criptoativos, que lesaram os investidores brasileiros em cerca de R$ 2,5 bilhões nos últimos anos. Além disso, a proposta ainda inclui diretrizes para dar maior transparência visando solidez e eficiência nas operações.
Em entrevista exclusiva à CRC!News, o senador Irajá Abreu (PSD-TO), relator da iniciativa legislativa, detalha esses e outros aspectos do projeto, que agora será apreciado pela Câmara dos Deputados, além de falar sobre a importância da regulamentação para o futuro do setor de criptoativos no país.
Confira os principais pontos da conversa:
O que motivou a criação de um projeto de lei para estabelecer um marco legal para o setor de criptoativos no Brasil?
Justamente a falta de uma regulamentação. Essas moedas estão em curva ascendente no mundo todo e não podíamos fechar os olhos para essa questão aqui em nosso país. Os criptoativos movimentaram R$215 bilhões em compra e venda só no ano de 2021. Fora o mercado como método de pagamento, que cresceu na ordem de 6% no último ano.
Na sua visão, quais os principais problemas da falta de regulamentação do setor no país?
A falta de um marco regulatório gera insegurança jurídica e facilita a ação de golpistas contra investidores. A própria mídia tem divulgado casos de pirâmides financeiras causando prejuízos milionários a empresas e cidadãos.
Como se deu a construção do projeto? Quais as principais demandas identificadas junto ao mercado e como o texto da lei busca contemplá-las?
O texto final que aprovamos no Senado é resultado do relatório substitutivo que apresentei no plenário englobando os projetos do deputado Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ) e dos senadores Flávio Arns (Podemos-PR), Styvenson Valentim (Podemos-RN) e Soraya Thronicke (União-MS).
Durante a construção do relatório, conversei com vários representantes do governo e do mercado. Estive com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, para ouvir a opinião do governo sobre essa moeda digital que vem crescendo em todo o mundo, e também participei de audiência pública no Senado com a presença de empresários e investidores.
A proposta reúne visões de diferentes setores ouvidos ao longo de vários meses e visa garantir um ambiente de negócios seguro e previsível para investidores e proteger o Sistema Financeiro Nacional (SFN), deixando-o preparado para lidar com as incertezas e volatilidades inerentes aos ativos virtuais.
Alguns países já adotaram criptoativos como moeda oficial. Nos EUA, o Goldman Sachs ofereceu seu primeiro empréstimo com lastro em Bitcoin na semana passada. E no Brasil, como o senhor vê a evolução do tema? Ele deve ganhar relevância nos próximos anos?
Depois que o projeto virar lei e fizerem o normativo infralegal, as negociações com ativos virtuais começarão a fazer parte do dia a dia dos brasileiros de forma natural. Empréstimos, pagamentos, negociações, depósitos e investimentos com ativos virtuais serão cada vez mais normais e acessíveis a todas as faixas da sociedade, assim como ocorre com o cartão de crédito/débito e mais recentemente com o PIX.
Um dos pontos que o seu projeto destaca é a prevenção de fraudes. De que maneira o marco deve inibir práticas ilícitas e como isso deve ajudar a trazer maior segurança ao mercado nacional de criptos?
O texto aprovado altera o Código Penal e prevê pena de dois a seis anos de prisão mais multa para aqueles que praticarem crime de fraude em prestação de serviços de ativos virtuais, valores mobiliários ou ativos financeiros. Isso inclui organizar, gerir, ofertar carteiras ou intermediar operações envolvendo ativos virtuais, valores mobiliários ou quaisquer ativos financeiros com o fim de obter vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.
Infelizmente, segundo dados oficiais, esses golpes chegaram ao patamar de R$2,5 bilhões, só no ano de 2021, e precisam ser punidos com todo o rigor da lei. É por isso que estamos aqui tipificando esse crime que não estava previsto no Código Penal brasileiro, muito menos nos crimes de colarinho branco. Ele é denominado e conhecido popularmente como crime de pirâmide financeira.
O projeto ainda destaca diretrizes ligadas a boas práticas de governança, como transparência nas operações, abordagem baseada em riscos, segurança da informação e proteção de dados pessoais. Qual a importância desses requisitos e como se espera que o mercado responda a eles?
Estes são princípios diretivos que orientarão a atuação das instituições reguladoras, como BC, CVM e Receita Federal, e darão a segurança jurídica e econômica necessárias para o funcionamento adequado do mercado de ativos financeiros.
Protege os investidores, instituições financeiras, órgãos governamentais reguladores e, por óbvio, o Sistema Financeiro Nacional e os demais métodos de pagamento e investimentos.
O mercado de criptomoedas dobrou de tamanho de 2019 pra cá, e o marco regulatório que aprovamos no Senado estimula que ele continue crescendo com segurança para investidores e combatendo as pirâmides financeiras e crimes de evasão e sonegação.
Acredito que o Brasil pode se tornar um grande centro de atração de investimentos, principalmente pelo incentivo que concede, até 31 de dezembro de 2029, benefício fiscal para compra de máquinas e ferramentas destinadas a empreendimentos que utilizarem em suas atividades 100% de energia elétrica de fontes renováveis e que neutralizem 100% das emissões de gases de efeito estufa oriundas dessas atividades. Serão zeradas as alíquotas de Pis/Pasep, Cofins, IPI e Imposto de Importação para importação, industrialização ou comercialização de hardware e software usados nas atividades de processamento, mineração e preservação de ativos virtuais desenvolvidas por pessoas jurídicas de direito privado.
Como estão as negociações em torno do projeto? Quais os próximos passos e as perspectivas para aprovação ainda este ano?
A expectativa é aprovar na Câmara dos Deputados ainda em maio para que o texto possa ser sancionado o quanto antes pelo Presidente da República.
Entrevista publicada na edição 35 da revista CRC!News. Leia todos os destaques do setor na última edição publicada domingo (22).