Quando se trata de trazer segurança para o mercado de criptoativos, educar e informar pode ser tão importante quanto criar normas, e o assessor de investimentos terá um papel essencial neste contexto. Essa é uma das conclusões a que chegaram os participantes do evento “Criptoativos – Regulação e Defesa do Investidor”, promovido pela ABAAI (Associação Brasileira dos Agentes Autônomos de Investimento) em parceria com a ferramenta online de controle de investimentos Gorila. Realizado na última quinta (19), na região da Vila Olímpia, em São Paulo (SP), o encontro contou com a presença da CRC!News e reuniu especialistas no tema para discutir os avanços do marco legal no país e suas implicações para o mercado.
Em sua fala, o presidente da ABAAI, Diego Ramiro, destacou a rápida expansão do segmento no Brasil, que hoje já reúne 10 milhões de investidores e faz do país o quinto maior mercado do mundo. “O brasileiro está passando de um extremo a outro, saindo da poupança e indo para o Bitcoin. Na prática, o cripto já faz parte da vida do assessor, pois os clientes perguntam. Porém, como não se trata de um mercado regulado, ele não pode indicar um ativo ou uma determinada prestadora de serviço”, revela.
Apesar de a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) não permitir que o assessor atue diretamente neste mercado, Juliana Facklmann, diretora de regulação e de design de produtos do Grupo 2TM, acredita que o profissional pode apoiar os clientes com um serviço similar, pois o investidor tem muita liberdade nesse mercado e demanda orientação. “Quando se tem muito poder, você também tem maior responsabilidade pelas suas escolhas. Então eu acredito que ter essa figura ajudando será fundamental para o desenvolvimento do segmento de criptoativos no Brasil”, revela.
Para Ramiro, os ativos virtuais se tornaram a bola de vez dos golpes financeiros justamente por serem uma novidade ainda pouco compreendida. E o papel do assessor será justamente o de ajudar o investidor a entender melhor a modalidade. “Nosso trabalho na associação é no sentido de preparar o profissional para essa missão de explicar o produto para o cliente. Estamos em contato com o regulador e queremos assumir o protagonismo. O risco não está em ser virtual, mas no desconhecimento”, opina.
“É um tema novo, não existem pessoas com um domínio completo e são muitos criptoativos no mercado. Então o papel educativo do assessor é fundamental, pois ele tem contato direto com o investidor”, acrescenta Robinson Dantas, cofundador do Gorila
O procurador de Justiça Fernando Capez argumenta que o fato de se tratar de um ativo abstrato dificulta a compreensão. Isso, aliado à ideia de que é possível alcançar altos lucros, cria um cenário ideal para a aplicação de golpes. “O combustível do estelionatário é a ganância da vítima. Temos que pensar primeiro na segurança das pessoas, e depois na ideia de liberdade. E com a regulação o próprio mercado se fortalece, pois se torna mais confiável e tem melhores condições de crescer e se desenvolver”, opina.
Normas têm alcance limitado
Mesmo reconhecendo a importância da regulação, Juliana alerta que ela não deve cobrir todas as falhas do mercado. “É essencial que as pessoas busquem conhecer o que estão comprando. Não é porque não é físico que não pode ter custódia, por exemplo. Todos esses conceitos se aplicam também no virtual”, afirma.
Segundo Isac Costa, professor do Ibmec e Insper na área de Direito e consultor em regulação financeira, a questão não afeta apenas o Brasil, pois o mundo inteiro está tentando descobrir como regular as criptos. No entanto, ele defende que o alcance da norma sobre a realidade é limitado, e o Estado só consegue atuar em quem se conecta com o mundo real, como os prestadores. E mesmo assim, existem formas de usar a tecnologia para escapar da fiscalização.
“A China é o segundo país do mundo no que mais minera mesmo com o governo local, que é muito forte, proibindo a prática. Hoje, é perfeitamente possível fazer um cadastro sem fornecer nome completo ou CPF. A pessoa transfere valores, exerce direitos típicos de sócio, e ninguém sabe quem é. A tecnologia foi criada para fins lícitos, mas viabiliza negócios que não são éticos e isso abala a credibilidade. Quando a fé é abalada, temos um problema enorme, pois esse é o combustível do mercado”, aponta.
Nesse sentido, Capez acredita que o principal trabalho deve ser na prevenção e na informação, porque depois que o golpe ocorre é muito difícil identificar os autores e recuperar valores. “O Procon chama para negociação e ameaça com multa. Mas isso funciona com empresas sérias, que se preocupam com reputação. Quando se trata de uma organização que premeditou o golpe e desapareceu, há pouco o que se fazer. É preciso proibir de atuar nesse mercado empresas sem lastro financeiro, abastecer o Coaf de informações atualizadas e buscar a responsabilização solidária dos sócios para oferecer maiores garantias para o investidor e coibir essas práticas”, encerra.
Leia todos os destaques do setor na revista CRC!News, texto publicado na edição 35.